Biogaleria

Aves

Azereiro: a árvore ancestral da Ibéria

Como o nome científico Prunus lusitanica subsp. lusitanica sugere, estamos perante uma árvore de ameixas que conseguiu, ao longo dos tempos, deixar uma mancha positiva nos livros de botânica, história e medicina por toda a Península Ibérica. Venha conhecê-la.

As suas flores, alinhadas ao longo de ramos lisos e acinzentados, balançam num ziguezague ventoso, deixando-nos verdadeiramente encantados por se equilibrarem com a perícia dos mais destemidos.

A espécie do azereiro, nas suas várias camadas, é transformadora, capaz de se adaptar à passagem do tempo, em sintonia com as estações do ano.

Do tipo Fanerófito, o azereiro parece saído de uma longa linhagem de árvores nobres. Efetivamente, tem diversos nomes e atributos históricos: conhecido por ginjeira-brava ou loureiro-de-Portugal, cresce habitualmente até 10 metros de altura, mas pode, se for cultivado de raiz e mimado pelos plantadores, alcançar 20 metros.

Flor sem odor

As folhas, descritas como coriáceas, são pendentes, mas também ovado-lanceoladas, oblongo-lanceoladas, drenadas e acuminadas com a página adaxial escura e lustrosa e a página abaxial mais pálida e sem glândulas.

O pecíolo é liso e de tons – habitualmente – vermelho-escuro. As estípulas são finas e sem pelos. Já os pedicelos e as sépalas são abertos ou semi-eretos, num formato triangular e ligeiramente peludo por dentro.

O tronco é de tez castanha, com tonalidades acinzentadas e uma textura rasa. Os ramos estão adornados com folhas de uma paleta verde- enegrecida que casa perfeitamente com a cor negra dos frutos. Simultaneamente, estas cores contrastam afincadamente com a brancura angelical das flores.

Estas últimas, por sua vez, irrompem como pequenas pipocas cintilantes durante a primavera, suspensas num pedúnculo sem folhas que raramente ultrapassa as 100 flores por cacho.

É hermafrodita, ou seja, apresenta os órgãos masculinos, conhecidos como estames, e os órgãos femininos, conhecidos como carpelos. Esta particularidade permite-lhe realizar a autofecundação.

O fruto negro, referido anteriormente, tem um processo de maturação digno das luzes piscatórias e multicolores das árvores de Natal: em fase de surgimento são verdes, em seguida, ao longo do processo, tornam-se laranjas, depois vermelhas, passando pela cor púrpura até se tornarem finalmente escuras, cor que sinaliza, simultaneamente, o início do outono.

À Ibéria mar plantada

Como o nome científico Prunus Lusitanica sugere, estamos perante uma árvore de ameixas que conseguiu, ao longo dos tempos, deixar uma marca positiva nos livros de botânica, história e medicina por toda a Península Ibérica. Especificamente, na zona da Lusitânia, onde atualmente se situa uma boa parte do território de Portugal.

Certamente, se pudesse falar, o azereiro relataria, pela tradição “floral”, parte da história da humanidade adjacente ao Atlântico. Espécie sobrevivente da última era glaciar europeia, tornou-se uma figura milenar, estendendo-se às ilhas dos Açores, Madeira e depois Marrocos, Espanha e França.

Com um certo brilho no olhar, podemos especular que, durante uma bela tarde de outono numa pequena aldeia da Lusitânia, encontramos um jovem Viriato encostado à sombra de um azereiro. Enquanto murmura uma desconhecida melodia pagã, as bagas que pendem sobre a sua cabeça embalam-no rumo a uma pequena sesta.

Saberia, por certo, que, se assim o desejasse, apenas poderia ingeri-las em módicas quantidades. A ingestão reduzida destas bagas melhora o sistema digestivo e proporciona um prazeroso bem-estar. No entanto, devido aos compostos de glicosídeos cianogénicos que produzem cianeto de hidrogénio, estas ameixas, quando ingeridas em demasia, são tóxicas para os humanos e provocam paragens respiratórias ou mesmo a morte.

Curiosamente, as bagas do azereiro são bactericidas, fungicidas e eméticas, ou seja, capazes de induzir o vómito. Os registos indicam que a casca era utilizada no tratamento de picadas de répteis – como cobras ou víboras – em ovelhas, vacas e outro gado.

Efetivamente, para os antigos povos desta zona, não seria difícil encontrar esta frutuosa iguaria. Nos dias de hoje, floresce em Portugal continental nas zonas do Minho, Trás-os-Montes, Beira Litoral e Beira Baixa.

Mas, evitando agora floreados, esta espécie tem preferência por ambientes sombrios e húmidos, surgindo ora em carvalhais ora ao longo das diferentes linhas de água, barrancos e talvegues, com capacidade de crescer em solos ácidos, férteis, bem drenados ou húmidos.

De igual modo, a sua longa história de sobrevivência confere-lhe, com sentido, a capacidade de tolerar o frio, a seca e ainda o vento continental e marítimo, por conta da folhagem firme e coriácea.

Musas da natureza

A natureza compõe cenários idílicos com uma noção estética inigualável. Neste prisma, o azereiro será, certamente, uma das suas “cores” preferidas. A forma como esta árvore de pequenas flores e folhas preenche os campos e realça o quadro envolvente de fauna e flora é verdadeiramente singular.

De tal forma, a sua presença equipara-se a uma musa natural que, inclusive, estimula a criação de microclimas, representando um papel importante no sustento de vários ecossistemas.

Mas, infelizmente, o azereiro, como “tinta” seca, desaparece. No nosso planeta existem aproximadamente 58.497 espécies de árvores, 30% das quais estão em risco de desaparecer e cerca de 17.000 em perigo, como referenciado na lista Vermelha da União Internacional para a Conservação da Natureza (UICN). Metade destas são endémicas, estimando-se que existam apenas 50 por cada espécie em perigo.

Em Portugal, existem cerca de 100 espécies de árvores nativas, das quais oito estão sob ameaça. O azereiro, infelizmente, protagoniza este perigoso declínio.

Esta situação é extremamente alarmante por conta da natureza, animais e humanos necessitarem das árvores para manter os ecossistemas e garantir o bom funcionamento da evapotranspiração, a retenção de dióxido de carbono nas raízes e a purificação do ar no planeta.

Sabia que…

  • A madeira do azereiro é utilizada, em Portugal, para fazer pequenos utensílios, como paus de cozinha.
  • Como mencionado anteriormente, é uma sobrevivente da última era glacial europeia, pertencente à flora-relicto semitropical que ainda hoje habita zonas da Madeira, como é o caso da Laurissilva.
  • É altamente considerada nos meios científicos pela sua natureza autóctone, pela sua capacidade de adaptação e pelo seu passado histórico.
  • PLANTA

  • GÉNERO

    Prunus

  • FAMÍLIA

    Rosaceae

  • HABITAT

    Zonas florestais, bosques ripícolas, carvalhais, margens de linhas de água, barrancos e talvegues. Sempre em locais sombrios e húmidos.

  • DISTRIBUIÇÃO

    Portugal, Espanha, Marrocos, França.

  • ESTADO DE CONSERVAÇÃO

    Em estado vulnerável – UV, de acordo com a IUCN.

  • ALTURA / COMPRIMENTO

    Geralmente 10 metros, mas pode alcançar os 20.

  • LONGEVIDADE

    Não atingem mais que 50 anos.

Como protegemos a espécie?

Como forma de proteção desta espécie, são definidas zonas com interesse para a conservação que são geridas de forma a manter ou melhorar os habitats (o azereiro é a espécie característica do habitat 5230pt2 – azereirais, com presença numa propriedade na zona de Oleiros) que proporcionam condições de alimentação, refúgio e reprodução, podendo funcionar como corredores ecológicos para facilitar a dispersão natural das espécies e o intercâmbio genético entre populações.

As medidas adotadas para a sua conservação foram:

  • Aumento da largura das faixas de proteção da linha de água passando de uma largura de 10 m para aproximadamente 50 m de largura;
  • Preservação de núcleos de azereiro para permitir efetuar uma gestão mais eficaz quer das áreas de produção e de proteção;
  • Alocar faixas de solo não mobilizado às manchas que contenham exemplares de azereiros;

Temas: