Planícies extensas e desabrigadas, aplanadas pelo tempo e pela cultura cerealífera, com ervas rasteiras e árvores e arbustos dispersos. É assim a estepe cerealífera portuguesa, a que também chamam pseudo-estepe, um habitat característico da paisagem alentejana, que serve de abrigo a um amplo conjunto de espécies, em particular aves.
A palavra estepe deriva do termo stepj, que significa ausência de árvores, e a existência de poucas ou nenhumas árvores e arbustos é típica deste habitat, que ocorre um pouco por todo o mundo, em vastas planícies distantes do mar e delimitadas por barreiras montanhosas, onde o clima é frio e seco.
As estepes da Eurásia – da Sibéria e Mongólia até à China – são, talvez, as mais conhecidas, mas a estepe existe também em zonas semiáridas do norte de África e do continente Americano (região central e Canadá), sendo na américa chamadas de pradarias. Em Portugal, encontramos um habitat semelhante na paisagem alentejana. Chamam-lhe estepe cerealífera ou pseudo-estepe exatamente porque existem diferenças.
Nas planícies alentejanas (que são, na verdade, peneplanícies, com ondulações aplanadas pelos desgastes da erosão ao longo de milénios), o clima quente e a ação humana são marcas distintivas. Tal como o montado, a pseudo-estepe alentejana só existe porque a pastorícia e a agricultura impediram a regeneração natural de boa parte das plantas de médio porte (sobretudo arbustos) que ali existiam naturalmente, moldando vastas extensões que acabaram por se converter em habitats para centenas de espécies. Sem a intervenção humana, muitos destes animais não teriam condições para ali se alimentarem, nidificarem ou viverem.
Esta paisagem, desde há muito moldada pela pecuária e agricultura extensivas, foi, inclusive, influenciada pela “Campanha do Trigo” que, nos anos 30 do século XX, incentivou a transformação de terras incultas em plantações de cereais de sequeiro.
Em várias zonas do Alentejo, de que é exemplo Castro Verde, manteve-se até ao presente uma paisagem aberta, onde se sucedem campos de cereais, plantados com trigo, aveia ou cevada; áreas cobertas pelo restolho, ou seja, pelas folhas e caules que permanecem sobre a terra após a colheita; zonas de pousio, deixadas em descanso para que o solo se restabeleça até nova plantação; e campos lavrados, que voltarão a ser plantados. A intercalar este mosaico, há também zonas com algumas árvores de sequeiro e zonas de pastagem de gado (sobretudo ovino).
Esta paisagem multifuncional da pseudo-estepe alentejana constitui, assim, um ecossistema de elevado valor e um habitat pouco comum para cerca de duas centenas de espécies de aves. Entre elas estão, por exemplo, a abetarda (Otis tarda) e o peneireiro-das-torres (Falco naumanni), ambas consideradas de conservação prioritária pela União Europeia, o sisão (Tetrax tetrax) classificado como Vulnerável em Portugal, a Quase Ameaçada calhandra-real (Melanocorypha calandra) o cortiçol-de-barriga-preta (Pterocles orientalis) e o Tartaranhão-caçador (Circus pygargus), ambos classificados em Perigo no nosso país, e mesmo a águia-imperial-ibérica (Aquila adalberti) uma das aves rapinas mais raras do mundo.
Os campos em pousio, os cobertos por restolho e aqueles onde crescem livremente ervas e flores – da esteva (Cistus ladanifer) e estevão (Cistus populifolius) ao rosmaninho (género lavandula) e ao cardazol (Centaurea ornata) –, são abrigo e alimento para estas aves e para muitos outros animais, desde gafanhotos e lagartos a coelhos e raposas. Nas espécies arbóreas, o destaque vai para as dispersas azinheiras (Quercus rotundifólia), por vezes acompanhadas por sobreiros (Quercus suber) e oliveiras (Olea europea).