Na próxima ida à praia, olhe com “olhos de ver” para a diversidade à sua volta, a começar pelas dunas. Mais do que areia, este habitat serve de lar a centenas de espécies, entre as quais se salientam muitas plantas e aves protegidas.
Portugal continental tem mais de 900 quilómetros banhados pelo Oceano Atlântico. Cerca de metade de costa é delimitada por formações rochosas enquanto a outra metade é protegida por dunas. A ocidente, as dunas litorais alongam-se, embora com interrupções, entre Espinho (Norte) e Vila Nova de Mil Fontes (Alentejo), sendo comuns também em algumas zonas do litoral algarvio.
Todas estas dunas são um sistema vivo e extremamente dinâmico, que se constrói e movimenta a partir de sedimentos transportados e depositados pelo vento. Desde que o relevo o permita, podem alongar-se por vastas extensões, constituindo uma barreira natural paralela à costa (um importante serviço do ecossistema), e encaminhar-se por quilómetros para o interior do território.
Sempre que o vento acalma e a areia repousa, as plantas costeiras – pequenas herbáceas – começam a fixar-se. São estas plantas que ajudam à criação da duna primária (também chamada de duna branca ou móvel). O estorno (Ammophila arenaria subsp. arundinacea) é uma das espécies aqui dominante, responsável pela fixação das areias, mas outras são igualmente comuns, a exemplo da morganheira-da-praia (Euphorbia paralias), da granza-marítima (Crucianella maritima) ou do cordeirinho-da-praia (Otanthus maritimus).
A vegetação torna-se mais abundante e diversificada na depressão desta duna ou zona interdunar, que está mais abrigada do vento, podendo ter acumulação de água, e onde os sedimentos mais finos e a matéria orgânica enriquecem o solo. Aqui são já comuns pequenos arbustos (alguns também visíveis na duna primária) como a madorneira (Artemisia campestris subsp. maritima), e o tomilho-das-praias (Thymus carnosus), este último mais comum a sul.
A biodiversidade da vegetação altera-se nas chamadas dunas secundárias ou cinzentas pela maior presença de matéria orgânica no solo, em cujas elevações e depressões é comum a presença de arbustos maiores e árvores. Aqui, os pinhais, plantados para travar o avanço das areias para o interior, estão entre as formações mais comuns, e os pinheiros-bravos (Pinus pinaster) assim como os mansos (Pinus pinea) convivem com muitas outras plantas espontâneas, desde a camarinha (Corema album), o samouco (Myrica faya) à sabina-da-praia (Juniperus turbinata), passando pelo lentisco (Phillyrea angustifolia) e pela aroeira (Pistacia lentiscus).
Quando a vegetação se desenvolve e cobre as areias, as dunas secundárias abrigam pequenos mamíferos e mais perto do mar é mais comum observarmos insetos – desde libélulas, borboletas e gafanhotos aos grilos, besouros e escaravelhos –, aracnídeos, e por vezes anfíbios e répteis. Mas no ecossistema dunar, as aves são o expoente e a sua diversidade é surpreendente. Há espécies que vêm de longe para passar o inverno, como o ganso-patola (Morus bassanus) e o corvo-marinho-de-faces-brancas (Phalocrocorax carbo), ou para aproveitar o verão, como a andorinha-do-mar-comum (Sterna hirundo) e a calhandrinha (Calandrella brachydactyla).
Na duna primária, pode ver-se o borrelho-de-coleira-interrompida (Charadrius alexandrinus), a chilreta (Sternula albifrons) ou a cotovia-de-poupa (Galerida cristata). Já na zona de duna cinzenta onde começa a mata, é frequente avistar o pisco-de-peito-ruivo (Erithacus rubecula), inúmeros chapins e até rapinas, como o gavião (Accipiter nisus) e o açor (Accipiter gentillis).
Várias destas espécies são alvo de proteção em Portugal, tal como os sistemas dunares que lhes servem de habitat, como é o caso da Reserva Natural das Dunas de São Jacinto ou da Reserva Botânica das Dunas de Troia, integrada na Reserva Natural do Estuário do Sado. O Plano Sectorial da Rede Natura 2000 integra múltiplos habitats de dunas, desde as Dunas móveis embrionárias (habitat 2110) às Dunas com florestas de Pinus pinea ou Pinus pinaster ssp. atlantica (2270).