A vegetação é exuberante e estende-se até onde a vista alcança, com mais nuances de verde do que é possível nomear. É assim na Quinta de São Francisco, um refúgio de biodiversidade, a dois passos de Aveiro.
Entre plantas autóctones e vindas dos quatro cantos do mundo, são mais de 400 as espécies de flora que tornam a Quinta de São Francisco num refúgio natural único em Portugal. O segredo de tão extensa coleção botânica deve-se à geografia e clima do local onde se situa esta Quinta e à paixão do seu fundador, Jaime de Magalhães Lima (1859-1936), um pensador, poeta e ensaísta que quis rodear-se daquilo que mais o fascinava – a natureza.
A apenas 10 minutos do centro de Aveiro, a sul da povoação do Eixo, a Quinta de São Francisco está localizada num vale abrigado, com cerca de 30 metros de desnível, conhecido localmente como Vale de Soão, em nome da linha de água, afluente do Vouga, que ali corre. A estas características junta-se o facto de estar situada numa área de transição entre os macrobioclimas temperado e mediterrânico, o que permite a boa-adaptação da flora típica de ambas as regiões e mesmo de espécies de zonas tropicais e boreais.
Aproveitando estas condições peculiares, Jaime de Magalhães Lima cuidou das espécies que ali cresciam naturalmente e, no início do século XX, juntou-lhes centenas de exemplares vindos de longe, que quis estudar e contemplar.
De entre árvores e arbustos, destacam-se inúmeras autóctones, com exemplares centenários de carvalho-alvarinho (Quercus robur) e outras espécies deste género botânico, como os sobreiros (Quercus suber) ou a carvalhiça (Quercus lusitanica). Juntam-se, entre dezenas de outras, pinheiros-bravos (Pinus pinaster), salgueiros (Salix spp.), amieiros (Alnus glutinosa), freixos (Fraxinus angustifolia), ulmeiros (Ulmus minor), sabugueiros (Sambucus nigra), loureiros (Laurus nobilis), medronheiros (Arbutus unedo) e gilbardeira (Ruscus aculeatus), esta última conhecida como “falso azevinho”.
A grande diversidade de flora, a presença de água em abundância (além da água corrente, há um lago e vários tanques), a abundância de fungos que enriquecem o solo (cerca de 50 espécies de cogumelos identificadas) são elementos que se conjugam em dezenas de habitats: um convite para os mais diferentes animais, das aves aos mamíferos.
Só aves, estão identificadas cerca de 70 espécies, 10 das quais rapinas, como a águia-de-asa-redonda (Buteo buteo) e o gavião (Accipiter nisus), ambas residentes. Alguns avistam-se bem alto nos céus, como falcão-peregrino (Falco peregrinus), outros, como o gaio (Garrulus glandarius), nidificam em grandes eucaliptos e carvalhos, e muitos outros, não menos vistosos, podem ouvir-se e avistar-se em ramos e folhagem, desde os guarda-rios (Alcedo atthis) à estrelinha-real (Regulus ignicapillus) passando pelos chapins (Parus spp.) e pica-paus, como o pica-pau malhado (Dendrocopos major) que vemos na foto acima.
Nos anfíbios, avistam-se com alguma frequência o sapo-comum (Bufo bufo) e o tritão-de-ventre-laranja (Triturus boscai). Entre os répteis, o maior é a cobra-rateira (Malpolon monspessulanus) e o mais raro o lagarto-de-água (Lacerta schreiberi), espécie que só existe naturalmente na Península Ibérica (endemismo). Já nos insetos, destacam-se inúmeros polinizadores e alguns dos seus predadores, como é o caso da enorme libélula imperador-azul (Anax imperator) e do maior inseto da Europa, a vaca-loura (Lucanos cervus).
Não faltam também os mamíferos, tanto os que vivem na Quinta de São Francisco como os que a perscrutam à procura de alimento: raposa (Vulpes vulpes), esquilo-vermelho (Sciurus vulgaris) e ouriço-cacheiro (erinaceus europaeus) são três entre cerca de duas dezenas.