Biohistórias

Plantas

O mundo fantástico da sexualidade das plantas

Temas:

Tal comos seres humanos, as plantas nascem, crescem, reproduzem-se e morrem. De forma assexuada ou sexuada, naturalmente ou com intervenção técnica ou de animais polinizadores, a Natureza multiplica-se e a sexualidade das plantas apresenta-se como uma das ferramentas essenciais para que tal aconteça. Descubra, neste artigo, o que se esconde por detrás da “magia” da reprodução das plantas.  

Num mundo em constante movimento, nem sempre nos lembramos de questionar as coisas mais simples. Alguma vez indagou como se processa a sexualidade das plantas? De que forma as árvores se reproduzem mesmo sem a intervenção humana?

Quem nunca perdeu largos minutos a admirar um jardim, reparando nos pormenores: uma abelha que poliniza uma flor; um pássaro que deixa cair uma semente com que voou quilómetros; ou um jardineiro que, quebrando o silêncio, faz a poda de uma árvore. Até os acontecimentos aparentemente mais banais podem, qual “efeito borboleta”, contribuir para o surgimento de uma nova planta.

A sexualidade das plantas está longe de ser linear, e pode acontecer de forma sexuada (há a união dos gâmetas feminino e masculino) ou assexuada (propagação vegetativa, a nova planta é geneticamente igual ao organismo inicial). Não obstante, há “personagens” secundárias nesta história que podem assumir um papel fundamental: é comum existir a intervenção de agentes polinizadores – abelhas, outros animais e até o vento –, bem como a ação das pessoas, que plantam novas áreas ou reformulam as já existentes.

A sexualidade das plantas: reprodução assexuada

Se é muito o que nos une às plantas, também é muito o que nos separa. No que diz respeito à sexualidade das plantas, uma das maiores diferenças prende-se com o facto de algumas espécies se reproduzirem de forma assexuada. Conhecida como propagação vegetativa ou clonal, a reprodução assexuada acontece quando uma planta tem a capacidade de originar outra sem a junção de gâmetas femininos e masculinos.

Sem necessidade de intervenção de polinizadores e técnicas humanas, as plantas reproduzem-se naturalmente, tendo como resultado “clones” seus; isto é, plantas exatamente iguais à original, tanto a nível genético como morfológico. Porém, tal pode representar uma desvantagem em termos evolutivos, já que a existência de caraterísticas pouco favoráveis em certos ambientes pode levar a que uma espécie não tenha capacidade de persistir.

A descoberta desta possibilidade foi verdadeiramente revolucionária para o conhecimento acerca das plantas, com o ser humano a beneficiar desta capacidade para propagar plantas com certas caraterísticas, nomeadamente mais resistentes. Esta metodologia permite um maior controlo sobre a produção de pomares, por exemplo, apostando em árvores mais produtivas, com maior probabilidade de resistir a pragas e a outro tipo de doenças e mais adequadas a um certo solo ou clima – esta resiliência é, aliás, a caraterística principal na seleção de indivíduos a propagar, quer na agricultura, quer na floresta.

De forma natural, a reprodução assexuada pode acontecer, a título de exemplo, por:

  • Apomixia: um pouco semelhante à reprodução sexuada, uma vez que também envolve um embrião, ainda que seja formado sem que haja a fusão de gâmetas. Nestas plantas não existe fertilização por pólen e é a divisão de uma célula diploide (núcleo celular com duas séries de cromossomas) que origina o desenvolvimento embrionário.
    Alguns exemplos de plantas que se reproduzem por apomixia: dentes-de-leão, amoras e algumas gramíneas, como a cabelo-de-cão-de-colmo-liso (Poa pratensis), na imagem.
  • Brotamento: a planta-mãe cria brotos com origem em si própria. Podem germinar em colónias – se crescer ligado ao organismo – ou, a certa altura do processo de reprodução, separam-se e vão resultar numa nova planta.
    Alguns exemplos de plantas que se reproduzem por brotamento: a cerejeira e as árvores cítricas, pessegueiros, macieiras, na imagem, e nogueiras.
  • Fragmentação: nas árvores, quando os ramos têm gemas (formação vegetal, ovoide ou subglobosa), estas podem desprender-se, por exemplo, devido ao vento ou algum animal, conduzindo à sua fragmentação. Se, ao chegarem ao solo, existirem condições favoráveis, podem resultar numa nova planta.
    Alguns exemplos de plantas que se reproduzem por fragmentação: o salgueiro e a Kalanchoe daigremontiana, na imagem

A sexualidade das plantas: reprodução sexuada

Para entender a reprodução das plantas, importa perceber que, tal como outros seres vivos, muitas plantas originam outras através da junção dos gâmetas feminino e masculino. Na reprodução sexuada, existe um órgão feminino (gineceu) e um órgão masculino (androceu); no caso das árvores, estes encontram-se nas flores.

As flores podem ser hermafroditas, se tiverem ambos os sexos (a mesma flor tem androceu e gineceu), ou ter somente um, podendo ser uma flor masculina ou feminina, dependendo do órgão que possui. No primeiro caso é possível que haja autopolinização (autofecundação), se bem que um estudo aponta para que cerca de 90% das plantas com flores hermafroditas se protejam –

a autopolinização está ligada ao aumento do risco de extinção devido a um potencial reduzido de adaptação. No segundo, falamos de polinização cruzada, fundamental nas plantas dioicas e monoicas. A polinização cruzada evita a acumulação de genes defeituosos e origina uma maior diversidade. Para esta polinização, é fundamental a intervenção de agentes externos, como das abelhas e outros animais, mas também água ou vento. A prímula (Primula acaulis), na imagem é um exemplo de plantas com flores hermafroditas.

Em árvores como o loureiro, as flores podem estar presentes em plantas diferentes (espécies dioicas), enquanto nas espécies monoicas, como a azinheira, as flores de sexos diferentes podem encontrar-se na mesma árvore. O processo de fecundação começa na polinização: o pólen gerado no órgão masculino, mais concretamente nas anteras, atinge o gineceu (órgão feminino) e desta fecundação resultam as sementes de onde nascerão outras plantas.

As plantas produtoras de sementes podem ser de dois tipos:

  • Grupo das angiospérmicas: as flores que estão na origem do processo reprodutivo são consideradas flores verdadeiras e têm pétalas. Os óvulos e futuras sementes encontram-se no interior de ovários fechados que darão origem aos frutos, sendo que este é tipo mais comum de plantas presente em todo o mundo. Exemplos: a pereira, a macieira, o eucalipto e o carvalho.
  • Grupos das gimnospérmicas: não têm flores verdadeiras, nem pétalas e, consequentemente, não possuem ovários fechados, e nem produzem Em todo o caso, as plantas possuem estruturas sexuais: o pólen é produzido e o processo ocorre, depois, nas estruturas femininas, produzindo a semente. Exemplos: o pinheiro, o cipreste, a sequoia e o abeto.

No que diz respeito à sexualidade das plantas, este tipo de reprodução oferece maior diversidade genética, ao contrário das plantas assexuadas, que são geneticamente iguais à planta-mãe. A junção dos gâmetas proporciona novas caraterísticas e uma maior adaptabilidade. Esta estratégia é explorada também por ação humana, com a instalação de colmeias, por exemplo, para potenciar a polinização em florestas e pomares.

A Natureza multiplica-se, renova-se e está em constante mudança, evoluindo e adaptando-se às necessidades exigentes que se foram apresentando ao longo dos tempos. Só as mais aptos têm a capacidade de sobreviver e perdurar no tempo, e esse conhecimento que “carregam” nas suas raízes contribui para que o ser humano – e produções com recurso a tecnologia – possam adequar as plantas às condições edafoclimáticas (ou seja, às condições do solo e clima), bem como resistir, cada vez mais, a pragas e doenças novas. A seleção de espécies mediante o ambiente e o controlo sobre a sua reprodução são fundamentais para uma boa gestão de recursos e até para a sobrevivência de algumas espécies, que desta forma conseguem responder às condições existentes em dada área.

Esta é uma história que se escreve de forma natural, uma evolução de milhões de ano que continua a escrever-se todos os dias, nas paisagens verdes que nos circundam, e nas quais o Homem se inspira.

Temas: